Cartão e cheque especial: CPI aprova relatório de Fernando Bezerra com 19 recomendações e prazos ao Bacen e Cade

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A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Cartões de Crédito aprovou, nesta quarta-feira (11), o relatório do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) com 19 recomendações aos órgãos reguladores do sistema financeiro; principalmente, ao Banco Central (Bacen). O parecer detalha três amplos grupos de medidas que deverão ser implementadas em um prazo de seis meses pelo Bacen e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). As propostas têm o objetivo de reduzir os juros do cartão de crédito e também do cheque especial. “Fundamental para a volta do consumo responsável e dos investimentos no país, o que refletirá na geração de empregos e na retomada do crescimento”, destaca Fernando Bezerra.

Organizadas em três categorias, as medidas propostas pelo relator destinam-se a beneficiar os consumidores ao aprimorar determinadas normas que regulam o mercado de cartões e meios de pagamentos. Elas são direcionadas à ampliação da concorrência e eficiência no setor bancário e financeiro; melhoria da educação financeira dos brasileiros; e redução do custo e do risco do crédito no país. Para a implementação desta terceira recomendação, a CPI apresentará três projetos de lei ao Congresso Nacional e também atuará para garantir mais celeridade a propostas legislativas que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado.

O enfrentamento da chamada “verticalização” do mercado, ao mesmo tempo em que sejam valorizadas as bandeiras nacionais de crédito, é uma das principais ações defendidas por Fernando Bezerra. Conforme analisa o senador, embora o país apresente clara concentração bancária – em que mais de 90% das movimentações são realizadas por cinco bancos privados e públicos – o controle da cadeia do crédito pelos grandes conglomerados financeiros demonstra ser o maior causador das altas taxas de juros do cartão e do cheque especial. “O problema da verticalização é o ponto-chave que tanto o Bacen quanto o Cade precisam enfrentar”, ressalta o vice-líder do governo no Senado.

Instalada no último dia 17 de abril, sob a presidência do senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), a CPI realizou cinco audiências públicas com a participação de todos os segmentos envolvidos. Entre eles, o SPC Brasil; a União Nacional das Entidades de Comércio e Serviço (Unecs); o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec); a Associação Brasileira de Empresas de Cartões de Crédito (Abecs); a Associação Brasileira de Crédito Digital (ABCD); a Federação Brasileira de Bancos (Febraban); representantes dos cinco maiores bancos públicos e privados (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco, Itaú/Unibanco e Santander); o Bacen; o Cade e o Ministério da Fazenda.

Confira, abaixo, o detalhamento de todas as recomendações feitas no relatório do senador Fernando Bezerra Coelho:

MEDIDAS PARA AMPLIAR A CONCORRÊCIA E EFICIÊNCIA NO SETOR:

1 – Projeto de lei da CPI para a transformação de recebíveis em títulos negociáveis dentro e fora do mercado financeiro. O projeto de lei determinará que o recebível se transforme em um ativo financeiro e possa ser transacionado em qualquer mercado, não somente o financeiro, por meio de um título de crédito livremente negociado. Dessa forma, os lojistas poderão, por exemplo, oferecer os recebíveis em garantia para fornecedores ou vender os títulos para fundos de direito creditório.

2 – Alterar a forma de cobrança do cheque especial, passando do atual percentual sobre o saldo negativo para uma combinação de tarifa fixa mais juros menores que as taxas atuais. De forma semelhante ao que ocorre nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, com a cobrança de tarifa fixa (que compense os custos da operação), a taxa de juros geral será reduzida, beneficiando os clientes que utilizam essa linha de crédito mais intensamente e por mais tempo. São justamente esses clientes que, atualmente, incorrem em maiores gastos com pagamento de juros e que apresentam maior risco de se endividarem fortemente. A lógica desta combinação é, além de baixar as taxas do cheque especial, desestimular o uso habitual dele, que deve ser utilizado como recurso emergencial e de forma responsável.

3 – Cobrança de uma combinação de tarifa fixa e juros no crédito rotativo, semelhante ao que ocorre nos Estados Unidos, Reino Unido, União Europeia. Segundo simulação realizada pelo Bacen, para cada aumento de R$ 10 em uma tarifa hipotética aplicada ao rotativo do cartão de crédito, a taxa de juros média se reduziria em 1,62 ponto percentual ao mês. Uma tarifa equivalente à metade do valor cobrado nos Estados Unidos, 19 dólares, ou R$ 69,52, reduziria as taxas de juros do rotativo não regular de 14,1% ao mês para 2,9% ao mês. A lógica desta combinação também é, além de baixar as taxas do crédito rotativo, desestimular o uso habitual dele, que deve ser utilizado como recurso emergencial e de forma responsável.

4 – Imposição de teto para a tarifa de intercâmbio na função crédito. A exemplo do que é praticado em outros países, acredita-se que a medida leve a uma redução da tarifa de desconto, reduzindo os custos dos lojistas, que seriam repassados para o preço final das mercadorias. A medida também se inspira no teto recentemente fixado pelo Bacen para a tarifa de intercâmbio na função débito.

5 – Redução do prazo de pagamento para os lojistas: enquanto no resto do mundo o usual é o lojista receber pela venda em D+1 (1 dia) ou D+2 (2 dias), no Brasil o lojista recebe, atualmente, em D+30 (30 dias). Esse desenho disfuncional obriga o lojista a ir ao mercado para antecipar os recebíveis, a fim de obter capital de giro, quando na verdade quem deveria financiar o portador são os bancos. A CPI recomenda que tal prazo passe a ser D+15 (15 dias) e que, em um período de 18 meses, o Bacen analise a possibilidade de redução para D+2.

6 – Medidas de desverticalização do mercado. A verticalização do mercado de cartões – com os maiores bancos se tornando emissores e controladores de adquirentes e bandeiras – permite que se crie uma série de subsídios cruzados, distorcendo os preços relevantes, com o objetivo de afastar a concorrência. Gera-se uma dupla ineficiência: pela distorção dos preços e pela menor competição. A proposta é que Bacen e o Cade avaliem que, em muitos casos, a solução pode residir não necessariamente na interferência na estrutura de um conglomerado verticalizado; mas, na punição dos que abusarem desta posição.

7 – Imposição de limites para as travas bancárias. Fundamental para ampliar a concorrência no mercado de recebíveis, a proposta é limitar a trava bancária ao valor financiado. Assim, os recebíveis, naquilo que excederem os valores antecipados, poderão ser livremente negociados no sistema bancário ou até em outros mercados, como fornecedores ou de valores mobiliários.

8 – Alterar a forma de tarifação na função débito, que passaria a ser um valor fixo (único ou por bandas) em vez de ser uma proporção do valor transacionado. Ao contrário do que ocorre nas transações na função crédito – onde há risco de inadimplência, o que faz com que o custo decorrente da inadimplência aumente com o valor da venda – nas transações a débito o custo tende a ser fixo.

9 – Incentivo ao desenvolvimento de pagamentos instantâneos: feitos principalmente por celulares, com disponibilidade imediata dos recursos para o credor da transação, para sua pronta utilização, independentemente das instituições nas quais o pagador e o recebedor tenham conta. Internacionalmente, têm sido vistos como a forma de pagamento mais próxima do dinheiro em espécie (a exemplo do QR Code, o código de barras bidimensional). Existe uma grande probabilidade de os pagamentos instantâneos contestarem, de forma efetiva, o sistema de cartões de pagamento.

10 – Aprimoramento da governança das entidades de classe e estruturas verticalizadas. Entidades representativas do setor (Febraban e Abecs, principalmente) deverão alterar suas regras de governança, representação e participação dos agentes no processo decisório das entidades, conferindo poderes isonômicos entre grandes bancos e suas controladas em relação às instituições de menor porte e entrantes. Considerando serem ambas entidades de autorregulação, é importante que as decisões sejam tomadas tendo como objetivo abarcar os interesses de todos os agentes do mercado e não somente os dominantes, o que minimiza possíveis conflitos de interesse.

11 – Fomento ao novo produto denominado “crediário”. Nesta modalidade, o cartão de crédito seria utilizado como meio de financiamento, com taxas menores e prazos mais longos aos portadores. O financiamento ocorreria no ponto de venda entre consumidor e emissor do cartão, trazendo transparência e equilíbrio à atividade de crédito ao consumo. Esta opção incrementa a penetração de cartões no consumo privado, contribuindo sensivelmente para a redução de taxas de juros em outras modalidades de crédito, como o rotativo do cartão.

MEDIDAS PARA MELHORAR A EDUCAÇÃO FINANCEIRA:

12 – Maior investimento em educação financeira. Os bancos emissores passam a ser obrigados a investir um percentual mínimo do faturamento em educação financeira, com o Banco Central impondo as diretrizes deste investimento.

13 – Projeto de lei da CPI que altera o Código de Defesa do Consumidor para proibir publicidade (enganosa) de parcelamento “sem juros”. A propaganda é considerada enganosa porque o custo dos juros está embutido no preço da mercadoria.

14 – Tornar as informações da fatura mais claras e úteis. Atualmente, as faturas contêm muitas informações, seja por força legal, regulamentar ou por decisão da própria instituição, nem sempre de fácil compreensão pelo consumidor sobre direitos e obrigações advindos da utilização do cartão de crédito. É preciso rever as faturas de forma a fornecer informações claras, didáticas e essenciais para o processo decisório dos consumidores.

15 – Projeto de lei da CPI que obriga bancos e lojistas a afixarem cartazes e avisos alertando os clientes sobre os riscos de se endividarem no crédito rotativo ou no cheque especial. A ideia é fazer algo semelhante com o que ocorre nas vendas de cigarro e bebidas alcoólicas: o Estado deve respeitar a decisão do consumidor de se endividar; mas, tem a obrigação de alertá-lo sobre os riscos decorrentes de sua decisão.

MEDIDA PARA REDUZIR O RISCO DO CRÉDITO (celeridade na tramitação de projetos de lei que tramitam na Câmara dos Deputados ou no Senado):

16 – Aprovação do Cadastro Positivo (PLP 441/2017). Permite reduzir a assimetria de informações, contribuindo para o aumento da concorrência e melhor diferenciação de taxa de juros, com clientes com menor probabilidade de inadimplência (os “bons pagadores”) recebendo ofertas de taxas mais baixas e clientes com maior probabilidade de inadimplência pagando taxas mais elevadas.

17 – Melhoria da Lei de Recuperação Judicial e Falências (PL 10220/2018). Permitirá maior agilidade bem como aumento no próprio volume de créditos recuperados, reduzindo a inadimplência. Dessa forma, o resultado final deverá ser uma queda na taxa de juros.

18 – Simplificar e criar instrumentos para a utilização de garantias no acesso ao crédito (PLS nº 141, de 2017, do senador Paulo Bauer): permite a instituição da garantia “guarda-chuva”, constituída para assegurar a abertura de limite global de crédito. O registro de garantia pode alcançar qualquer operação que venha a ser firmada entre cliente e banco e não apenas uma operação creditícia. A facilidade permite que o crédito pessoal seja obtido na instituição financeira com a mesma garantia que já foi oferecida em outro financiamento, o que tende a diminuir ospread bancário (resumidamente, o “lucro dos bancos”) e os juros finais aos tomadores de empréstimos, já que torna as operações mais seguras para o credor, com menor risco de perda.

19 – Demais projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional que contribuem para aperfeiçoar o mercado de crédito:

  • O PLS 243/2014 permite a contratação de operações financeiras por meios eletrônicos/remoto, conferindo maior segurança jurídica de contratos e de seus meios de prova;
  • O Projeto de Lei nº 5.900/2016 visa reduzir a litigiosidade bancária, prevendo uniformização das tabelas de correção de débitos judiciais dos tribunais estaduais e da justiça federal, adotando-se padrão único que abrangeria juros de mora e correção monetária. Estabelece, ainda, requisitos objetivos para a concessão da gratuidade de justiça;
  • O PLS 377/2017, do senador Jorge Viana, estabelece a obrigação de os bancos publicarem, no site, taxas de juros máxima, média e mínima, além dos juros anuais e mensais, dos cartões de crédito que oferecem. Também faz recomendação ao Bacen para que sejam adotadas, desde já e no âmbito da competência do Banco Central, as medidas trazidas por este projeto;
  • O PLS 272/2018, do senador Ataídes Oliveira, que proíbe que a instituição emissora ou credenciadora do cartão de crédito exija exclusividade quanto à antecipação de recebíveis e imponha trava bancária além do volume de recebíveis necessários para garantir a operação de crédito.

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