‘Na contramão’ revela o drama dos jumentos abandonados no Nordeste

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Na música “Apologia ao jumento”, gravada nos anos 1960, Luiz Gonzaga faz uma apaixonada defesa de um dos animais-símbolos do Nordeste. “O jumento é nosso irmão. Quer queira ou quer não“, diz a letra composta em parceria com José Clementino. Hoje em dia, no entanto, o bicho já não ocupa o mesmo lugar de reconhecimento entre os moradores do semiárido.

É o que revela a série documental “Na contramão”, produzida em parceria pela Rima Cultural e a REC Produtores. Dividido em três episódios de 26 minutos, cada, o programa vai ao ar de quarta (12) a sexta-feira (14), às 21h, na TV Pernambuco.

Com direção de Marcelo Pinheiro e fotografia de Ivanildo Machado, o documentário traz à tona o processo de marginalização do jegue. Em função dos novos recursos trazidos pela modernidade, o sertanejo acabou trocando o lombo do quadrúpede pelas motocicletas. Sem função econômica, os animais passaram a ser abandonados pelas beiras de pistas, sujeitos a matar ou morrer em acidentes.

A proposta da série nasceu ao perceber tantos jumentos mortos nas estradas do Sertão. Foi quando entrou um pouco da curiosidade jornalística de tentar compreender o que é que estava provocando aquilo“, conta Ricardo Mello, que divide roteiro e argumento da série com Rafael Marroquim. O trabalho foi desenvolvido por meio do edital DOC.PE Inovação – Brasil de Todas as Telas, de 2014, gerenciado pela Agência Nacional do Cinema (Ancine).

Em busca de respostas, a equipe percorreu quase seis mil quilômetros, passando por cidades de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e da Bahia. Durante o trajeto, os realizadores se depararam com outras questões que vão além da modernização do semiárido, dando maior complexidade à produção.

Embora a gente tenha feito uma boa pesquisa anterior, que durou seis meses, quando chegou a hora de filmar, a cada dia surgia algo diferente para irmos atrás. Acabou virando quase um documentário investigativo“, conta o diretor. O abate clandestino, o comércio ilegal de couro e o confinamento em fazendas como solução momentânea para os acidentes noturnos são algumas das problemáticas somadas à discussão central do abandono.

Por outro lado, é ressaltado o importante trabalho de ONGs internacionais e nacional pela preservação dos asnos. Mesmo enfrentando várias dificuldades, essas instituições – além de pesquisadores ligados a universidades – denunciam os abusos e buscam encontrar soluções para o drama vivido pelos animais no Nordeste. Ao mesmo tempo, há agricultores que ainda conservam uma relação de afeto com os seus jumentos, devidamente registrados com os nomes que seus donos escolheram, no final da série. “Uma das coisas com as quais a gente se preocupou foi dar personalidade a eles. Nos apegamos a alguns deles. Então, teve um envolvimento emocional também”, diz.

Sobre o futuro do jumento, “Na contramão” não aponta uma resposta conclusiva. Especialistas, produtores, ativistas, artistas e agricultores mostram diferentes visões sobre o assunto. “Já começou a haver um despertar de algumas pessoas, só pelo fato da gente buscá-las para participarem da série. Acho que com a estreia, isso será um dado de ajuda para que o bicho, pelo menos, venha a ter uma vida mais confortável“, acredita Marcelo.

O desejo dos produtores é dar prosseguimento ao trabalho, exibindo-o em rede nacional e transformando-o em um filme de longa-metragem. Já está confirmado uma versão em jogo digital, batizada de “Donkey Blast – Na contramão”, voltada para o público infantil. “A ideia é seguir com a pesquisa, porque muita coisa ficou no ar“, defende Ricardo.

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